CPI da Covid não vai prender nem fazer impeachment, prevê senador Alessandro Vieira, membro da comissão

CPI da Covid não vai prender nem fazer impeachment, prevê senador Alessandro Vieira, membro da comissão

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), um dos membros da Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga a atuação do governo de Jair Bolsonaro no enfrentamento da pandemia de coronavírus, não acredita que o trabalho da CPI vá terminar em impeachment do presidente. Para ele, a decisão de tirar Bolsonaro do poder deve ser da população.

“Particularmente, acho que os fatos que estamos comprovando são gravíssimos, mas que a gente talvez tenha que caminhar para uma eleição. O eleitor, devidamente informado, vai fazer sua escolha. Democracia é isso”, afirmou Vieira, em entrevista à BBC News Brasil.

“Tenho dito que a CPI não prende ninguém, não condena ninguém nem faz impeachment. CPI faz relatório.”

Segundo ele, dificilmente o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (Progressistas-AL), vai aceitar um pedido de impeachment, principalmente por fazer parte da base do governo.

Durante a entrevista, o senador afirmou que o governo Bolsonaro seguiu a orientação de “negacionistas” ao não responder às propostas de vacinas da Pfizer e cometeu crimes ao promover políticas de enfrentamento da pandemia que não seguem consensos científicos. “Não é crime ser negacionista nem defender coisas estúpidas, mas é crime fazer gestão pública com base nisso”, afirmou.

Ele também criticou a postura de colegas que espalham desinformação nas sessões da comissão, como o senador Luis Carlos Heinze (Progressistas-RS). “Não podemos ter um senador da República passando informação falsa em canal público, usando dinheiro público. Opinião é outra coisa. Se a gente não tiver ferramentas para filtrar isso, vamos deformar a sociedade”, disse.

Ex-delegado, o senador sergipano, que já foi da Rede, partido de Marina Silva, hoje se declara independente. Ele conta ter se arrependido “profundamente” de ter votado em Bolsonaro nas eleições de 2018.

“Subestimei o mal que Bolsonaro poderia fazer”, disse ele, que ressalta também não concordar com o projeto político do PT.

Confira a entrevista abaixo.

BBC News Brasil – Boa parte da CPI tem girado em torno da recusa do governo Bolsonaro de comprar vacinas da Pfizer. O governo apresentou como justificativa a questão das cláusulas leoninas e o fato de a vacina não ter na época aprovação da Anvisa. Acha que essa justificativa é suficiente?

Alessandro Vieira – As justificativas do governo não param em pé. O diretor-presidente da Anvisa, o almirante Antonio Barra Torres, esteve na CPI e foi taxativo: para fazer compras de vacinas, não precisa de registro na Anvisa nem autorização de uso. O que é necessário é que haja interesse e proteção. No caso da Pfizer, a empresa deixou muito claro o compromisso de pagamento mediante autorização da Anvisa.

Isso se repetiu com outras vacinas. Havia propostas de garantia de compra, e as empresas correriam atrás do desenvolvimento e produção. E, se desse errado e o registro não saísse, o governo seria ressarcido. Era uma compra garantida. Não há justificativa técnica para não fazer a compra a não ser uma escolha política.

A escolha foi por não comprar com base em uma orientação equivocada do chamado gabinete paralelo. E essa orientação fez com que o governo investisse em cloroquina e desinformação em vez de informar o cidadão e garantir vacinas.

BBC News Brasil – Muitos governistas têm dito que não há nenhuma irregularidade no fato do presidente ter se aconselhado com pessoas que não fazem parte do Ministério da Saúde, como o deputado federal Osmar Terra e a médica Nise Yamagushi. Qual é a irregularidade de fato?

Vieira – Tenho usado uma frase bem coloquial em relação a isso: não é crime ser negacionista nem defender coisas estúpidas, mas é crime fazer gestão pública com base nisso. O problema não está em o presidente ter um assessoramento paralelo, o problema é esse assessoramento ser incompatível com a gestão do Ministério da Saúde.

Criou-se a figura do ministro que é a “rainha da Inglaterra”. Há um corpo de secretários e convidados que atendem a orientações políticas e pseudocientíficas. Até agora, eles não conseguiram apresentar um único estudo decente e que dê lastro ao que eles falam.

Então, essa turma tem interferência junto ao presidente da República, que impõe uma política equivocada.

Há inúmeras amostras. O próprio Eduardo Pazuello, com todos os defeitos dele, anunciou a compra de vacinas da CoronaVac, mas foi desautorizado pelo presidente instantaneamente. Dimas Covas, diretor do Instituto Butantã, disse que, depois da declaração do presidente, realmente as negociações esfriaram.

No final, o governo acabou comprando. Mas por quê? Porque João Doria iria aplicar a vacina e o STF cobrou o plano de vacinação.

Não podemos perder essa memória. A narrativa governista diz que o Bolsonaro fez tudo pela vacina. É mentira. Ele fez tudo para não comprar.

O problema-chave é que o Brasil investiu praticamente todas as linhas no sentido contrário ao consenso global. O mundo correu atrás de vacinas, e a gente parou. O mundo parou de falar em tratamento precoce, e a gente está falando até hoje. O mundo correu para informar as pessoas sobre a importância do isolamento social e eventualmente aplicou medidas como o lockdown, e o Brasil sabotou essa política o tempo inteiro.

O resultado está aí: quase 500 mil brasileiros mortos.

BBC News Brasil – Testemunhas como Pazuello, Queiroga, Mayra Pinheiro têm constantemente negado que o governo priorizou a cloroquina em vez da vacina. Que provas a CPI tem para apontar que o governo de fato escolheu um remédio sem comprovação científica como política de enfrentamento?

Vieira – Vou dar um exemplo. O setor jurídico do Ministério da Saúde começou a tratar das vacinas da Pfizer em dezembro de 2020, mas o primeiro contato da empresa é de março de 2020. Ela tentou por todos os meios possíveis fazer contato. E não teve respostas.

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