Festival de cinema de Brasília chega à 55ª edição

Festival de cinema de Brasília chega à 55ª edição

Ansiedade e emoção. Esse era o clima que predominava no primeiro dia do 55º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. O evento chega à 55ª edição com filmes de todas as regiões do país. São mais de 40 títulos em cartaz de 14 a 20 de novembro, no Cine Brasília, em formato presencial. Jorge Bodanzky é o grande homenageado do festival que, em seu primeiro dia, encontrava-se lotado de pessoas prontas para prestigiar o cinema brasileiro.

Este é considerado o “festival do retorno”. Isso porque depois de dois anos realizada de forma virtual, a maior e mais representativa mostra de filmes do país volta a ocorrer em um formato que tem a cara original. Ou seja, pulsante, vibrante e altamente interativa. Uma das características marcantes do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (FBCB), sempre foi e será a presença do público.

Com quase 1.200 filmes inscritos, a seleção oficial do 55º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro é dividida entre longas e curtas das mostras Competitiva Nacional e Brasília, além de duas mostras paralelas de longas e sessões hors-concours. Para Pê Sobrinho Moreira, de 26 anos, estar expondo nesse festival é emocionante e muito bonito, pois ela estreou o filme no primeiro dia de evento. “Minha primeira direção, no Festival de Brasília, um dos maiores festivais de cinema do país”, comenta. O curta intitulado “Ave Maria” teve um processo de produção de três anos. “Escrevi ele em 2019, conseguimos, em 2020, financiamento para realizá-lo pelo 2º Edital do Audiovisual de Niterói, no Rio de Janeiro, e fomos interrompidas pela pandemia. Mas o tempo de maturação encaminhou muito bem o filme”, declara a diretora carioca.

Como compartilha Pê, o “Ave Maria” é parte de uma pesquisa sua sobre rasura da binariedade. “Isso está refletido tanto nas relações das personagens (em especial a protagonista) com gênero e suas performances, mas também de uma maneira mais profunda na relação com o duo vida/morte”, explica. “Pisar nesse terreno é parte das minhas investigações afetivas mas também teóricas sobre esse desejo de rasura. O filme é uma investigação das minhas possibilidades de fazer relação com o mundo a partir da minha experiência enquanto uma pessoa não-binária”, pontua a diretora.

O filme de Pê é sobre fazer família, sobre fazer relação, através do tempo, do espaço e do desejo de estar junto. “Ele é muito e principalmente sobre a feitura de relação com nossos ancestrais vivos e mortos. Nele, Maria, uma jovem travesti, sai de casa depois da morte repentina do pai, seu melhor amigo. Depois de um ano sem ver a família, ela volta para passar a véspera de Natal com eles e a gente assiste essa refeitura dos laços e a troca de diferentes afetos entre as personagens”, adiantou a idealizadora do material.

A edição 2022 está focada no retorno ao ambiente de exibições presenciais e na reconstrução de políticas do audiovisual brasileiro. Procurando ampliar a janela de filmes em competição e mantendo a marca histórica de 6 longas e 12 curtas nacionais, o Festival de Brasília inicia os trabalhos já com a Mostra Competitiva Nacional na noite de abertura. Os filmes competem por quase 30 troféus Candango, em sessões apresentadas sempre às 20h30, de 14 a 19 de novembro. A direção artística desta edição é assinada pela produtora Sara Rocha.

Visitando o evento pela primeira vez, a jovem estudante Ana Carolina Vargas conta que está apaixonada pelo evento. “Nunca tinha vindo, não sabia que tinha tantas opções de atividades e tanto filme lindo para ser apreciado”, diz Ana. “Estou muito animada aqui, os títulos trazem assuntos atuais e importantes para a sociedade. Eventos como esse deveriam ser mais divulgados pois tem uma relevância social muito grande”, finaliza a jovem moradora de Águas Claras.

E Ana está certa. Crítica, irreverente, polêmica, mas sempre participativa, é a plateia do festival dos festivais, que ajudou a forjar a identidade do evento por meio de intensos e provocativos debates político-sociais. E reflete, por meio dos filmes projetados na tela mágica do Cine Brasília, como está e o que pensa o Brasil.

Grande amante do cinema, Atanagildo Brandolt volta a prestigiar o evento depois dos anos de pandemia. “Já vim em algumas outras vezes, mas confesso que esse me surpreendeu devido a quantidade de pessoas. Acredito que seja pela questão da pandemia, essa retomada, com certeza, atraiu mais gente”, acredita.

Atanagildo trabalha com cinema nas ruas, e conta estar muito satisfeito em estar no evento como espectador. ““Faço cinema nas ruas, temos uma estrutura móvel que faz cinema aberto à população, bem como nas escolas. Damos, ainda, oficina de vídeo para alunos da rede pública”, declara. “Então vir aqui no festival, participar como espectador, é algo muito interessante. Eu acho de suma importância esse tipo de evento pois é a consagração de realizadores cinematográficos. É um evento que merece ser prestigiado”, finaliza o brasiliense.

Para o secretário de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal, Bartolomeu Rodrigues, “nada se compara ao prazer de ter de volta o Festival de Cinema à tela do Cine Brasília e ao calor das pessoas que se habituaram a interagir com os filmes, atores, diretores e produtores”, disse. O gestor espera, sinceramente, que o festival cumpra seu papel histórico “de questionamentos e renovação”. “O cinema cultural, o cinema entretenimento, o cinema negócio, tudo se mistura e está na mesa para os debates. Evoé, jovens cineastas!”, convoca o chefe da Secretaria de Cultura e Economia Criativa (Secec).

A escolha dos filmes 

Diretora artística desta edição do FBCB e à frente da organização da sociedade civil Box Cultural, que agora administra o espaço juntamente com a Secec, Sara Rocha, neta do cineasta Glauber Rocha, tem suas expectativas quanto o que será a edição de  2022. De acordo com a titular, o que pautou a escolha dos filmes, tanto na competição nacional quanto da programação global, entre as mostras paralelas e de homenagens, além de filmes em sessões especiais, foi a forma de cada um de enxergar questões e assuntos que são urgentes hoje para a sociedade brasileira e que precisam ser melhor debatidas.

Segundo Sara, são narrativas instigantes, próprias e, ao mesmo tempo, afetivas, que falam sobre esses traumas todos pelos quais o Brasil passou nos últimos anos historicamente”, avalia. “Os filmes trazem questões sociopolíticas relevantes, com engajamento, espírito produtivo, mas, ao mesmo tempo, esse momento de reconciliação e reflexão mais afetiva que o cinema traz com muita propriedade para melhorarmos enquanto sociedade e seres humanos”, afirma.

Destaques do DF

Este ano, na programação da mostra competitiva de longas-metragens, há duas produções do Distrito Federal concorrendo ao prêmio máximo do festival. Uma delas é o doc-drama Rumo, da dupla Bruno Victor e Marcus Azevedo, que aborda o sistema de cotas raciais em universidades brasileiras por meio da trajetória de sonho e luta de uma mãe e um filho que vivem na periferia do DF. Ambos nutrem a paixão pelos estudos e a meta de conquistar um diploma acadêmico. ““Estamos retornando ao palco do Cine Brasília para contar a história de uma das políticas públicas mais importantes do país, as cotas raciais”, conta o diretor Bruno Victor.

A outra produção do DF é Mato Seco em Chamas, de Adirley Queirós e Joana Pimenta, trama futurista que analisa as consequências de certos grupos da sociedade em áreas carentes. Cineasta de Ceilândia, Adirley tem feito uma trajetória marcante com filmes contundentes que discutem o abismo entre a periferia e os grandes centros urbanos.

Longas-metragens

Entre os longas da Mostra Competitiva Nacional foram selecionadas duas produções do Distrito Federal, feito inédito na história do festival: Mato seco em chamas, de Adirley Queirós e Joana Pimenta, obra futurista que explora os impactos da presença da extrema-direita em ambientes de favela; e Rumo, de Bruno Victor e Marcus Azevedo, sobre a trajetória de implementação das cotas raciais em universidades brasileiras.

Mostra Brasília

Na famosa e tradicional Mostra Brasília, uma seleção de quatro longas e oito curtas-metragens produzidos na capital disputa 13 troféus CLDF, acompanhados de R$ 240 mil em prêmios concedidos pela Câmara Legislativa do DF, incluindo R$ 100 mil para o melhor longa e R$ 30 mil para o melhor curta pelo júri oficial. Na categoria júri popular, o longa vencedor receberá R$ 40 mil, enquanto o curta agraciado ficará com R$ 10 mil. A comissão de seleção de filmes é formada pelo produtor Sidiny Diniz, o publicitário Allyson Xavier, a produtora Simônia Queiroz, o cineasta Péterson Paim e o curador e crítico Sérgio Moriconi.

Entre os longas, O pastor e o guerrilheiro marca o retorno do veterano cineasta José Eduardo Belmonte ao festival que o revelou. A produção debate os conflitos históricos e o triste legado da ditadura militar brasileira. “Estou muito feliz por estar voltando ao Festival de Brasília, muito honrado. E onde acontece o festival foi fundamental para a minha carreira, muito especial esse reencontro”, destaca. “E retorno a Brasília contando uma história que tem muito a ver com a minha própria história, muito UnB, coisas que acreditei e vi, lugares que passei, um retorno diferente, um olhar interessante, um momento muito generoso essa volta”, resume José.

O diretor Felipe Gontijo, por sua vez, apresenta Capitão Astúcia, aventura que une neto e avô para debater envelhecimento. Realizador de Sobradinho, Pedro Lacerda documenta os livreiros candangos Ivan Presença e Chiquinho da UnB nos desafios impostos pelos novos modelos de negócio do mercado editorial em Profissão Livreiro; e Wesley Godim fecha a seleção de lonas com Afeminadas, documentário sobre o universo drag queen de Brasília.

A seleção de curtas também aponta para um vasto panorama da nova produção local. Desamor, de Herlon Kremer, aborda o delicado tema da separação; Super-heróis, de Rafael de Andrade, celebra os heróis do cotidiano; Plutão não é tão longe daqui, de Augusto Borges e Nathalya Brum, cria a fictícia favela Plutão, às margens da Ceilândia, onde se abrigam opositores de um governo autoritário; e Manual da Pós-verdade, de Thiago Foresti, investiga o lugar da produção jornalística em meio às fake news.

Carolina Monte Rosa apresenta Tá tudo bem, curta que debate diferenças sociais atenuadas pelo isolamento social; e Juliana Corso exibe Virada de jogo, filme que conecta narrativas femininas através da dor e do amor próprio. Marcelo Cuhexê traz ao festival Levante pela Terra, obra captada no acampamento homônimo, realizado durante a pandemia, em Brasília, contra o avanço de leis que impactariam nos direitos indígenas; e Vínícius Schuenquer apresenta Reviver, filme sobre perdas do passado e superação.

Mostras paralelas e sessões especiais 

Este ano, o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro já inicia sua programação com a Mostra Competitiva, dispensando um filme de abertura. Outras obras, no entanto, somam-se às obras selecionadas para sessões especiais, com títulos prestigiados do cinema nacional, também para duas mostras paralelas: Reexistências e Festival dos Festivais. Em tributo ao diretor Jorge Bodanzky, o 55º FBCB apresenta ao público uma pequena mostra com produções do homenageado desta edição.

Conhecido por dar preferência a títulos inéditos, o Festival de Brasília ganha também a Mostra Festival dos Festivais, para apresentar três filmes com passagens bem sucedidas por outras competições nacionais. São eles: o cearense A filha do palhaço, de Pedro Diógenes, sobre a relação entre pai e filha nos tempos atuais; o paulista Três tigres tristes, de Gustavo Vinagre, que narra a saga de três jovens queer numa São Paulo assolada por uma pandemia cujo vírus afeta a memória; e o goiano Fogaréu, de Flávia Neves, uma produção ambientada em meio à modernidade do agronegócio em Goiás, onde se discutem origens familiares e segredos do passado.

Ambiente de mercado 

O 55º Festival retoma, após a pandemia, as atividades do Ambiente de Mercado, em sua quarta edição, para estimular, fomentar e mediar rodadas de negócios, pitchings e encontros com players. Uma novidade para este ano será a realização da Clínica de Projetos, uma atividade presencial preparatória para as rodadas de negócios e os pitchings abertos do Ambiente de Mercado.

Nos dias 14 e 15, a clínica apresentada por Krishna Mahon oferece cinco consultorias para realizadores que puderem estar presentes na semana do festival e quiserem preparar a venda de projetos para o mercado audiovisual. Além da Clínica de Projetos, o 55º FBCB promoverá encontros e pontes entre criadores, especialistas, realizadores e importantes players na programação do Ambiente de Mercado nos dias 17 e 18 de novembro, presencialmente, nas dependências do hotel-sede do festival.

O objetivo da iniciativa é promover trocas de experiências, enriquecer redes de contatos, negociar projetos, fortalecer o produtor brasileiro independente e fomentar a produção cinematográfica do Centro-Oeste. Para participar da Clínica de Projetos, das Rodadas de Negócio e dos Pitchings Abertos do Ambiente de Mercado é necessário se inscrever até o dia 31 de outubro por meio de formulário disponibilizado no site do festival: www.festcinebrasilia.com.br.

Oficinas Online

E as novidades não param por ai. Como forma de democratizar o acesso e o conhecimento para todo o Brasil, as atividades formativas do 55º Festival de Brasília serão realizadas online, pela plataforma Zoom, durante os dias do festival.

As inscrições foram até o dia 31 de outubro, pelo site do festival, para as oficinas gratuitas de Assistência de Direção, Distribuição e Comercialização, Desenvolvimento de Roteiro para Webseries, Treinamento de atuação para cinema,  além de uma formação em jogos digitais apresentada pela Associação dos Desenvolvedores de Jogos Eletrônicos do Distrito Federal (Abring).

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